quarta-feira, abril 20, 2005

Jornal das 11 / dia 20 de Abril

Ruben


Foi bonita a festa, pá.
É bonita a festa, pá.
Vai ser bonita a festa, pá.

Hoje, o 'blog' é só teu...

Ruben de Carvalho trouxe a poesia para dentro da política de Lisboa, no momento exacto em que fez a sua primeira intervenção no Hotel Alpha, ali na Columbano, a Sete Rios, já como candidato da CDU a cabeça de lista para a câmara de Lisboa.
Quando Ruben leu o extracto de um poema de Garcia de Resende, escrito há 500 anos e tão actual que até quase se refere a Carmona e Santana (a Lisboa, o que falta é um bom governo e nada mais, diz o poeta lá na sua fórmula especial…), aí, a sala não se conteve: desatou a aplaudir e marcou assim o resto da tarde.

Eis a sua belíssima intervenção, diferente e bem desenhada, bela e de encantar, que ele leu muito bem:


«Como tantas vezes na vida pessoal e colectiva, este nosso encontro constitui uma espécie de vértice, esse ponto em que duas linhas se cruzam para, como escreveram os geómetras medievais, assinalar que qualquer coisa ali se conclui e, em tal conclusão ancorado, algo de novo começa.
Este ponto de chegada e este ponto de partida têm um espaço comum, um trabalho comum, um sonho comum: viemos até aqui por causa da Lisboa em que vivemos – e sobre a qual temos indignações e tristezas; daqui sairemos para trabalhar e lutar pela Lisboa, por essa outra Lisboa onde se viva um presente feliz e um futuro confiante.
No belo texto em que define a cidade como «ao mesmo tempo objecto natural e sujeito de cultura; indivíduo e grupo; vivida e sonhada: a coisa humana por excelência», Claude Levi-Strauss escreve também que «não é pois de forma metafórica que se afirma o direito de comparar – como tantas vezes se tem feito – a cidade a uma sinfonia ou a um poema: são objectos da mesma natureza.»
Como bem o saberão, concordo com tal ideia... E peço-vos licença para aqui trazer uns versos dum fino e irónico observador da nossa cidade, mas – imagine-se! – vão lá quase cinco séculos!
Escrevia então o homem que daria o seu nome ao monumental ‘Cancioneiro’ a cuja reunião dedicou grande parte da sua vida:

Lisboa vimos crescer
Em povos e em grandeza,
E muito se enobrecer
Em edifícios, riqueza,
Em armas e em poder.
Porto e trato não há tal.
A terra não tem igual
Nas frutas, nos mantimentos.
Governo, bons regimentos
Lhe falece, e não al.

Garcia de Resende (1470-1536)

Não sei, confesso, a que governação municipal se referia Garcia de Resende... Mas, valha a verdade, ela bem podia ser a que tivemos – ou, para falar com mais propriedade, a que sofremos – nos últimos quatro anos.
De resto, camaradas e amigos, penso que poucas vezes a política portuguesa terá enfrentado intervenções governativas simultaneamente tão desastradas, tão incompetentes, tão arbitrárias como as que o PSD e o CDS impuseram primeiro à Câmara de Lisboa e depois, desafortunadamente, a todo o País.
O caos que a presidência de Pedro Santana Lopes introduziu em Lisboa – e no qual, evidentemente, há que repartir responsabilidades com os restantes membros da sua equipa e em especial o mais responsável, o eng. Carmona Rodrigues – deixa um caderno de encargos de insuspeitado peso: não se fez o que se devia fazer; fez-se (ou começou atabalhoadamente a fazer-se) o que não devia ser feito; paralisou-se, mutilou-se o que se fizera; desarticulou-se aquilo em que condições estavam criadas para que se fizesse.

Tem sido posta, com justiça, a tónica em problemas criados à cidade como o túnel do Marquês de Pombal, as negociatas de casinos, Parque Mayer, Feira Popular, os atropelos ao PDM ao sabor de escusas operações imobiliárias, mas gostaria de vos sublinhar que há talvez um problema bem mais grave do que todos esses e inquestionavelmente, aquele por onde a alternativa democrática e de esquerda tem de começar no município.
O que é absolutamente indispensável e urgente fazer é repor a todos os níveis a governação da cidade tal como o nosso ordenamento constitucional a define e a nossa tradição municipal e democrática impõe. Lisboa precisa de uma Câmara que governe; uma Câmara que governe com um programa definido e responsável; uma Câmara que elabore e concretize esse programa com os cidadãos, com a cidade, com as estruturas, com as freguesias. Uma Câmara que seja responsável, eficaz e, sobretudo, democrática.
No complexo e multifacetado tecido urbano, as contradições – luminosamente o pensamento europeu o mostrou, de Marx a Max Weber, de Fernão Lopes a Herculano, de Gomes Ferreira a Cardoso Pires – não param à porta da urbe: atravessam-na e é a intervenção sobre elas que constitui a razão última da necessidade e da legitimidade da política.
Ao falar dessa crescente complexidade, o atento observador da contemporaneidade que é Jürgen Habermas escreveu que «os problemas que o urbanismo é chamado prioritariamente a resolver não relevam apenas da organização do espaço, mas bem mais do restabelecimento de uma regulamentação enfraquecida; trata-se de limitar ou de controlar os efeitos de mecanismos anónimos que tendem a impor os seus imperativos à vida urbana e assim ameaçam destruir a especificidade do tecido urbano.»
A Cidade tem de ser governada sob pena de se aniquilar ao sabor dos interesses de alguns; mas para que esse governo a faça viver é necessário que seja o governo de todos.
Eis, no fundo, a chave do que nos propomos: governar Lisboa; garantir a boa governação por a fazermos participada, com os lisboetas, com trabalho, com honestidade, com competência.

Para nós, os que aqui estamos, sabemos que este programa é simultaneamente simples e ambicioso.
Não lutamos por Lisboa há 4, 10 ou 30 anos: lutamos por Lisboa desde que a classe operária portuguesa deu o passo histórico de forjar o seu instrumento de intervenção política, o Partido Comunista Português. Temos essa determinação serena das árvores frondosas que, lançando fundas raízes na terra, ano após ano e dia após dia lançam novos ramos à conquista do céu.
Temos da política e da vida uma visão nobre e generosa, combativa e construtora. Não praticamos a «política do possível». Assumimos que «impossível» é apenas o nome que ontem se deu ao que hoje se constrói e amanhã se vive.
Não colocamos a priori limites à capacidade realizadora do Homem e aprendemos também com a própria Cidade: nela pode viver-se independente, mas não se pode viver isolado. Na Cidade aprende-se que o trabalho constrói tanto mais progresso quanto mais o faz em colectivo. A Cidade exige o trabalho colectivo exactamente ao mesmo tempo que o constrói.
Por isso somos a Coligação Democrática Unitária, a CDU.
Que hoje anuncia aqui ao povo de Lisboa que com ele quer participar na reconstrução da Cidade.
Do nosso camarada António Modesto Navarro ouviram dos alicerces de que partimos. Do nosso camarada Jerónimo de Sousa ouvirão o que o nosso colectivo partidário estudou e decidiu.

Temos um objectivo.
É difícil?
É.
Mas temos na nossa própria experiência esse programa tão simples e belo que, como alguém escreveu, tem «como primeiro objectivo fazer do extraordinário um fenómeno ordinário da vida quotidiana».


O tempo é urgente.
Ao trabalho.»



Três comentários

Estes comentários que se seguem ouvi eu, lá na sala do hotel, a pessoal dos jornais:

1. «Ai, Carrilho, Carrilho».
2. «Com esta é que o Carrilho não contava».
3. «O Carrilho, num debate, até fica amarelo».


E o Miguel Sousa Tavares? Ele está verdadeiramente apaixonado pelo Ruben. Viu-se ontem, na TVI.