O ninho das cegonhas
Ao chegar certo mês, a cegonha chegava. Ao chegar certo mês, a cegonha ia-se embora.
Rigorosamente, sistematicamente, ano após ano: sempre na mesma.
(Depois, deixaram de chegar. Foi o tempo da alteração das estações, do aquecimento global etc.).
«Já chegaram as cegonhas» - a frase percorria as bocas e os ouvidos.
Era sempre um casal que abancava ali: no alto da torre.
Ou então:
«Ainda não chegaram as cegonhas» - como quem dissesse que algo estava errado ou que não se devia ter pressa para fazer determinada lavoura.
E as cegonhas a «tocarem carchanetas»? Ou seja: a baterem as duas partes do bico uma na outra ritmadamente, rapidamente, tipo castanholas…
Sinal de alegria dos animais, uma alegria que se transmitia aos seres humanos.
«Olha, a cegonha já está a fazer o ninho» - bom sinal: o ritmo do planeta continuava firme e seguro, a vida ia decorrer na maior.
Semanas depois, já com o ninho feito, uma delas começava a não sair e a ficar sempre a guardar o ninho.
Já conhecíamos essa fase: havia ovos para chocar.
Depois nasciam os filhotes. Vigiávamos quando é que levantavam as cabecitas. Olhávamo-los como se fossem animais de estimação lá de casa...
Depois, as cegonhas passavam o dia a ir e vir com bichos no bico para os enfiarem pelas goelas dos pequenitos – e nós a observar aqui e ali cada gesto delas e a comentar o que elas faziam…
Mas um dia, o cenário acabava e a distração também:
«Olha, as cegonhas já se foram embora!»…
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