quarta-feira, agosto 02, 2006

O Dr. Rosa e Marcelo Caetano

Sentença sábia em noite de passeio

À beira de entrar para a Faculdade de Direito, passei muitas noites a passear com várias pessoas jovens e sempre acompanhados do Dr. Rosa, que nos ia industriando em algumas coisas importantes da vida de Lisboa e não só.
Percorríamos aquele quilómetro e tal da estrada que serve de rua principal da aldeia até lá em cima ao sítio exacto de onde se avistam os píncaros da Serra da Estrela.
E era ali que se parava e se trocavam ideias e larachas.
O Dr. Rosa era o nosso mentor. Um deles, vá lá. Mas talvez o mais insistente e mais importante desse tempo das nossas vidas.
Quem era o Dr. Rosa?
Um licenciado e professor de História. Tinha feito Histórico-Filosóficas na Clássica de Lisboa e era muito conceituado entre nós.
Muitos anos mais tarde, viria a ser Secretário Regional de Educação dos Açores, num dos últimos governos de Mota Amaral.
Mas, mesmo sendo um conservador, nada tinha a ver com o PSD (então PPD) «caceteiro».

Parêntesis:

O PSD daquela minha zona era, de facto, «caceteiro» – não propriamente na minha aldeia, onde não tinha espaço: a freguesia teve uma Comissão Administrativa com base em comunistas e socialistas, foi palco de acções do MFA (por minha iniciativa), ali se ocupou um equipamento que ainda hoje é público (o «Centro», para um Centro de Animação Cultural – e aí começaram problemas pois a malta do PS, incluindo o meu vizinho deputado e Governador Civil Alberto Antunes só apoiou a ocupação a contra-gosto… quando fomos em manifestação popular à «Quinta», residência dos proprietários do edifício ocupado pedir – mesmo pedir – para que a propriedade fosse dada ao povo – e foi… Coisas desses tempos inenarráveis). Depois, a aldeia até votou CDU (então FEPU) nos primeiros mandatos autárquicos, depois PS (o meu pai foi outra vez presidente da junta de freguesia, pelo PS, depois dos cinco anos de «nojo» pois tinha tido o mesmo cargo no tempo «da outra senhora»; depois, a aldeia ainda votou PSD num ou dois mandatos e agora, há muito tempo, outra vez PS.

Fechar parêntesis…

Volto ao Dr. Rosa, de quem posso dizer com certeza absoluta que era um homem conservador, mas nada «empedernido»: pelo contrário foi sempre um homem de espírito leve e aberto…

A estória que vou contar aconteceu numa dessas noites, logo a seguir a sabermos que Salazar cai da cadeira. Estávamos em Setembro de 1968. Nessa exacta noite, soubemos que lhe sucedia Marcelo Caetano.
Íamos nós pela estrada fora, parámos no mesmo sítio de sempre, onde se começa a ver a Serra da Estrela. As estrelas já lampejavam.
E pergunto-lhe eu, que daí a uns dias devia dar entrada na Faculdade de Direito de que Marcelo deixava agora de ser Director, e isso interessava-ma mais a mim do que aos restantes jovens:
- Dr. Rosa, como é que este é?
Resposta pronta dele:
- Calça o mesmo número. A forma é que é diferente…

(Nota: na palavra «forma», aqui, a primeira sílaba lê-se fô. Os sapatos eram feitos no sapateiro com uma «fôrma».)

Esta «sentença» ficou-me para sempre. Aquele professor de História não podia ter descrito de melhor forma a situação. E todos os futuros lhe deram inteira razão.
Calçava de facto o mesmo número. Mas os sapatos eram de outra «forma»…

2 comentários:

Anónimo disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
José Carlos Mendes disse...

Não vale a pena chatear. Sempre que alguém tentar avacalhar com linguagem escatológica ou ofensas pessoais - seja a mim, seja a terceiros -, zás: "delete comment". É que não me custa absolutamente nada.

Escolha outro caminho.
Não é por aí...